“Minha história é muito parecida com a de outros brasileiros”, diz Cardoso. “Meus pais vieram da Bahia para São Paulo no fim dos anos 1980 em busca de uma vida melhor e foram parar em uma comunidade que estava se formando na época, o Jardim Pantanal, na zona leste de São Paulo. Como tantas outras que surgem na cidade, era uma área inadequada e sem estrutura”.
As enchentes faziam parte do calendário do bairro. “Convivíamos por meses com a água nas ruas e dentro das casas. Meu pai ia trabalhar de chinelo, com a calça dobrada e uma garrafa de água nas mãos. Quando chegava em um lugar seco, lavava os pés e colocava o sapato. Na volta para casa a situação se repetia". O bairro também sofria com condições precárias de saneamento.
Cardoso conta que a família chegou a perder uma casa tentando construir andares sobre as lajes para fugir das enchentes. “Chegou a um ponto insustentável. Meus pais tiveram de demolir tudo e fomos morar em uma casa bem menor".
O pai estudou até o segundo grau e trabalha com logística de obras, o que inspirou o filho, ainda menino, a trabalhar no ramo da construção civil. A mãe completou o ensino fundamental e após o divórcio passou a trabalhar como empregada doméstica para melhorar a renda da família.
Estudar era uma necessidade. “Meus pais sempre nos incentivaram a estudar. Era a janela de oportunidade, o caminho para sair do Jardim Pantanal. E isso valeu para mim e para os meus irmãos. Minha irmã mais velha é professora na rede pública e o caçula estuda engenharia aeroespacial na Universidade Federal do ABC".
Inspirado na profissão do pai, animado com o bom momento que vivia a construção civil, o jovem Matheus decidiu cursar o técnico em edificações na ETEC Tereza Nunes em Arthur Alvim e o ensino médio na ETEC Aprígio Gonzaga na Penha, ambos na zona leste.
“Consegui ingressar em engenharia no Mackenzie com uma bolsa do Prouni, os dois primeiros anos eram período integral, mas no sétimo semestre eu precisei trabalhar e a rotina foi bem pesada”.
Matheus saía de casa no Jardim Pantanal às 3h30 da madrugada para conseguir chegar na Vila Olímpia no horário comercial usando transporte público. “Eu saía do trabalho e seguia para a faculdade em Higienópolis e só aí voltava para casa. Muitas vezes, só conseguia ir para a cama depois de uma hora da manhã, praticamente não dormia”.
E foi percorrendo a cidade e observando as diferenças que Matheus decidiu que precisava fazer algo pelo Jardim Pantanal. “Eu saía de um lugar de alta vulnerabilidade para trabalhar e estudar em lugares onde o metro quadrado é caríssimo. Só percebi a desigualdade social quando eu me deparei com as diferenças. Por que não transformar o Jardim Pantanal?”. Essa foi a semente para o projeto do Moradigna.
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