terça-feira, 11 de dezembro de 2018

As tuas apps sabem onde tiveste a noite passada: a reportagem do New York Times que deves ler


Imagem via Strava

Algumas apps podem recolher a localização precisa dos utilizadores mais de 14 mil vezes por dia. Apesar de muitas vezes ser referido que é uma colheita anónima, essa informação pode permitir traçar um perfil fidedigno do dia-a-dia das pessoas.

A tecnologia permitiu o nascimento de uma nova e revolucionária economia digital mas trouxe também uma série de problemas. Problemas que podem não ser propriamente novidade, mas que continuam a merecer motivo de reportagem jornalística, a bem do esclarecimento público.

“Your Apps Know Where You Were Last Night, and They’re Not Keeping It Secret” é o título da mais recente investigação do New York Times (NYT), que parte de um facto já mais ou menos consumado: há apps no nosso telemóvel que recolhem a nossa localização, seja para nos informar sobre a meteorologia para hoje ou dar recomendações de restaurantes próximos de nós, o problema é que não se ficam por aí. Se a recolha da localização é alegadamente útil para recebermos conteúdo geograficamente relevante, ainda é mais lucrativa para os detentores das apps – é estimado que a venda de anúncios segmentados por localização chegue aos 21 mil milhões de dólares este ano.

“A IBM entrou no sector com a compra das apps do Weather Channel. A rede social Foursquare reformulou-se como uma empresa de location marketing. Investidores proeminentes em location start-ups incluem a Goldman Sachs e Peter Thiel, o co-fundador do PayPal”, escreve o NYT.

O jornal norte-americano testou, entre Julho e Novembro, o comportamento de uma série de aplicações Android e iOS e avaliou dados facultados por uma empresa que analisa milhares de apps móveis. Desde a aplicação do Weather Channel ao theScore, que recomenda equipas locais relevantes para o utilizador, às apps do metro de Washington D.C. e de Londres, e ao Masha And The Bear, um jogo infantil.

Feita a investigação, o NYT afirma que pelo menos 75 empresas recebem de forma anónima e precisa a localização de utilizadores que autorizaram os “serviços de localização” em apps — ainda que muitas vezes esse consentimento não seja claro ou expresso. O jornal percebeu que algumas dessas apps podem recolher a localização precisa dos utilizadores mais de 14 mil vezes por dia e que, apesar de muitas vezes ser referido que a recolha é totalmente anónima, certo é que essa informação pode permitir traçar um perfil fidedigno do dia-a-dia das pessoas, identificando a quem pertence cada dispositivo.

Nesta brilhante reportagem, é dado o exemplo de uma utilizadora do norte do Estado de Nova Iorque viu a sua localização registada 8600 vezes, ou seja, uma vez a cada 21 minutos em média. Isso permitiu ao jornal fazer um mapa das suas viagens desde a sua casa até à escola onde trabalha, bem como as suas deslocações até ao ginásio ou a casa do ex-namorado.







O New York Times observa também que “aqueles com acesso aos dados em bruto – incluindo funcionários ou clientes – podem identificar uma pessoa sem consentimento. Podem seguir alguém que conhecem, identificando um telefone que regularmente passa tempo no endereço da casa daquela pessoa. Ou, trabalhando em sentido inverso, podem anexar um nome a um ponto anónimo, vendo onde um dispositivo passa as noites e usando registos públicos para descobrir quem mora lá”.

Como lembra Snowden recorrentemente, a privacidade não tem a ver com termos algo a esconder mas com o nosso direito a sermos anónimos. A recolha de em larga escala pode ser perigosa, dando às empresas um poder que se calhar não deveriam ter, em troca de vantagens que nem sempre são absolutas como nos são apresentadas. Na reportagem o New York Times fala de empresas especializadas em criar apps e código com este propósito, em que muitas vezes o consentimento do utilizador é obtido através da promoção de funcionalidades, acabando por servir outros propósitos.

A boa notícia é que podes desactivar os “serviços de localização” no teu telemóvel, seja ele Android ou iOS. O NYT explica como neste artigo. A má é que nunca sabemos ao certo o que determinada aplicação vai fazer com os nossos dados e que na maioria dos casos, faça o que fizer, nada lhe acontecerá, a não ser um destaque pela negativa na imprensa que rapidamente será esqueci.

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